Você faz-de-conta que ensina, o aluno faz-de-conta que aprende

  No conto Alice no País das Maravilhas, ela pergunta ao gato invisível se pode ajudá-la e ele pergunta onde ela está indo e “não sei” foi a resposta, neste caso, o gato responde: “então, qualquer caminho serve”.

  Vivemos em um País de “faz-de-conta”, fazendo de conta que somos cidadãos, os políticos fazem de conta que isso é verdade, os professores fazem-de-conta que ensinam, os alunos fazem-de-conta que aprendem, todos fazem-de-conta que pagam impostos e o governo faz-de-conta que o imposto é justo, e assim aos tropeços fazemos-de-conta que somos felizes e que somos uma verdadeira nação.

  Para não passar em branco, a esquerda faz-de-conta que conhece os fundamentos do socialismo/comunismo e a direita faz-de-conta que são defensores da democracia, e o Centro faz-de-conta que estão todos certos, enfim, todos fazem-de-conta que defendem a democracia e que a democracia dos outros está errada.

  Fazemos-de-conta que levar nossas crianças com 2 anos para as creches-escolas, vai educá-las, deixando por conta das professoras-babás a responsabilidade de ensinar-lhes valores e conceitos para uma nova vida.

  Fazemos-de-conta que não sabemos que a personalidade delas se forma até 7 anos de vida e que a presença dos pais nesta fase é crucial, para não fazermos-de-conta na adolescência delas que entendemos suas atitudes, afinal, nos afastamos na fase mais importante das suas vidas, onde poderíamos pelo menos orientá-las de acordo com nossos valores sociais. Fazemos-de-conta que não entendemos porque em alguns países do 1o mundo a educação das crianças só se inicia aos 6 anos, porque será?

  Ao iniciar a vida de estudante, os jovens se confrontam com uma modalidade educacional voltada para o credencialismo, ou seja, todo o objetivo é a conquista de um diploma, e se veem envolvidos em um emaranhado comercio de livros didáticos e accessórios intermináveis, e fazemos-de-conta que todos são necessários, serão totalmente utilizados, seu conteúdo é adequado e não tem nenhuma doutrina subliminar.

  Sabemos que o brasileiro figura nos últimos colocados no ranking de leitura, e que só passa 2% do seu tempo de estudante dentro de uma biblioteca, enquanto os ingleses chegam a 54%. Assim, fazemos-de-conta que a toneladas de livros que somos obrigados a comprar para as crianças eles irão utilizar.

  Se perguntarmos a qualquer estudante brasileiro, e ouso afirmar, aos universitários também quem foi Pedro II, com certeza eles se assustarão e dirão, ué, houve um Pedro I? Imaginem perguntar quem foi José Bonifácio, ou Deodoro da Fonseca, Rui Barbosa, vão perguntar se participaram do BBB, mas com certeza uma grande maioria saberá quem foi Che Guevara, embora a maioria pense que foi um cantor de reggie.

  Fazemos-de-conta que as avaliações da qualidade da educação no Brasil, foram criadas realmente para saber a qualidade do ensino e não para melhorar nossa participação no quadro mundial, melhor termos mais doutores analfabetos funcionais, que analfabetos doutores.

  Fazemos-de-conta que decorar a única fonte de informação que nos é fornecida em livros de péssima qualidade e tirar uma nota na prova, nos credencia a passar de ano e repetir tudo de novo, embora não entendamos nada do que nos foi perguntado na prova.

  Fazemos-de-conta que temos autodisciplina para estudar à distância, que temos compromisso inabalável para acompanhar as aulas on-line e resolver as questões sozinhos, afinal, pensamos que no futuro também vamos trabalhar só à distância.

  Fazemos-de-conta que o investimento feito em incentivo à pesquisa, que resultou em um grande aumento de trabalhos científicos publicados por brasileiros, são de excelente qualidade, embora tenhamos caído no ranking mundial pela péssima qualidade das publicações e um expressivo aumento de plagio.

  Fazemos-de-conta que o professor, peça chave de todo o processo educacional é de excelente qualidade, ensina por vocação, e é bem remunerado, e que a maioria teve orientação voltada para novas metodologias. Ouso dizer que muitos profissionais que se dedicam ao ensino, são profissionais que não deram certo em seus empregos nas profissões na qual se formaram. Afinal, ninguém se forma em medicina ou engenharia apenas para dar aulas.

  Fabio Reis, Doutor em História Social pela Universidade de São Paulo (USP), publicou pesquisa sobre as tendências da educação superior e os modelos de governança e gestão das IES – instituições de Ensino Superior, publicou:

“As instituições de ensino superior (IES) são organizações acadêmicas que, ao longo do tempo, demonstram resistências às mudanças, em função da fragilidade das lideranças, da postura conservadora perante as novas realidades, do corporativismo acadêmico e da permanência de concepções de “universidade” elaboradas no século XIX e início do XX. É que preciso repensar essa concepção e atualizá-la, em função da dinâmica do século XXI.”

  Em sua publicação, identificou 7 (sete) tendencias no ensino superior, que passarei a comentar sem fazer-de-conta que não considerou as diferenciações educacionais entre as nações, assim, considero que estas tendências referem-se exclusivamente ao nosso país.

1) Os sistemas educacionais serão mais Mobile e os avanços tecnológicos vão permitir que as diversas formas de ensino online tornem-se superiores ao do ensino unicamente face to face, em número de matriculados e em qualidade. Os nichos face to face vão permanecer;

  Em relação ao Brasil, discordo que o ensino on-line torne-se superior ao Face to Face. Com certeza o numero de alunos aumentará significativamente pelo alcance territorial que as mídias oferecem alcançando cidades e municípios que jamais teriam uma unidade de ensino superior presencial produzindo a inserção educacional pela inviabilidade econômica,

  O nicho presencial é imprescindível para a boa formação da pesquisa científica. Infelizmente, o brasileiro não foi ensinado a aprender, apenas responder questões em avaliações com o único objetivo concluir os estudos e receber o diploma, afinal, nossa metodologia pedagógica foi orientada para o credencialismo.

2) O ensino será mais desagregado ou fragmentado, pois os estudantes vão querer vivenciar diversas experiências de aprendizado, via cursos abertos e cursos específicos, por exemplo. Os estudantes vão optar por escolas flexíveis em seu modelo curricular;

  O ensino será desagregado e fragmentado, mas os estudantes não vão conseguir identificar as experiências necessárias para sua formação pela simples falta de um currículo adequado para a formação profissional que oriente para as habilidades e competências de cada profissão.

  Com certeza, cursos adicionais sempre serão necessários para a complementação de uma orientação escolar e profissional que orientam nossos programas educacionais. De que serve flexibilidade curricular se o aluno não sabe identificar suas necessidades?

3) O ensino será mais personalizado, pois os estudantes vão fazer opções de trajetória, na formação escolar. Eles irão para a escola e terão a oportunidade de construir a sua carreira de graduação, a partir de diferentes possibilidades temáticas. O professor será um coach, um mentor que orienta o aprendizado, uma pessoa que ajudará os estudantes a elaborarem seus projetos e seus objetivos de aprendizado;

  Entendo que o ensino personalizado é o direcionamento do aprendizado de acordo com as vocações de cada aprendiz. Em um país que não tem orientação vocacional, além de provocar uma debandada de 70% de desistência de alunos nos primeiros meses de aula por terem escolhido o curso errado, torna-se impossível escolherem qualquer trajetória para sua formação, muito menos escolher possibilidades temáticas.

  Para ser mentor, o professor deve ter experiência pratica e formação voltada para as habilidades interpessoais, desenvolvimento intelectual e ter uma visão clara do processo educacional a seguir. As pessoas não projetam seus objetivos de aprendizado, apenas a intensidade e profundidade de acordo com suas metas profissionais, pois o mercado determina de forma holística o caminho a seguir.

4) Haverá um foco maior na avaliação da aprendizagem. Haverá mais preocupação com o engajamento dos estudantes, com a eficiência do aprendizado e com as estratégias que possibilitam os estudantes aprenderem. O crucial será tornar o aprendizado algo significativo;

  O significado do aprendizado é a inserção no mundo do trabalho e da contribuição para o crescimento humano. A avaliação do aprendizado deverá focar nos resultados e não na nota da prova para passar de ano. O engajamento não deveria ser preocupação da sociedade mas individual e fazer parte dos anseios dos jovens desde o primeiro dia de aula na sua infância.

  Nossas crianças tem que saber que televisão não é o mundo real, que os vídeos games não ensinam logica matemática e que o mundo não está preocupado com o sucesso deles, muito menos pena deles. Eles tem que entender que o aprendizado é a única opção e se devotarem a isso, até para questionar o mundo.

5) A educação será mais acessível, o que permitirá pessoas de diferentes culturas e lugares do mundo terem acesso a ofertas educacionais com custo menor e com qualidade reconhecida pelos agentes reguladores e pela sociedade;

  A educação já é acessível embora equivocada. Como contar com agentes reguladores que só objetivam o ranking da educação da ONU? Como esperar programas educacionais adequados desenvolvidos por pessoas que não foram formadas nestas metodologias? Como eliminar a orientação doutrinária que se implantou nas escolas de base?

  A sociedade precisa de comprovação e resultados para aprovar profissionais. Como confiar em profissionais que estudaram à distância, completaram seus estudos em cursos abertos e não conseguiram nenhuma prática em estágios de empresas competentes? Você faria uma cirurgia com cirurgião que se formou à distância? Com certeza, no meio da operação ele abriria o computador e perguntaria ao Google, estou perdido o que faço agora?

6) O ensino será mais global, em função do avanço do ensino virtual, das redes de cooperação, das facilidades de deslocamento das pessoas e da própria presença de novos players nos sistemas educacionais;

  A principal dificuldade para a integração global do aprendizado do estudante brasileiro é a dificuldade de falar uma segunda língua. Nosso processo educacional equivocadamente, além da total falta da orientação vocacional, não inclui o aprendizado de um segundo idioma, o inglês para ser mais objetivo, e o hábito da leitura. Não é à toa que somos os penúltimos colocados neste item, pois só dedicamos 2% do nosso tempo de aprendizado em bibliotecas ou lendo livros.

  A dificuldade do segundo idioma impossibilita as redes de cooperação e ficamos indefesos perante as traduções mecânicas dos tradutores robotizados.

  A tecnologia está presente através de grandes players, embora suas vocações não sejam educar, mas faturar, como Google, Amazon, etc, que são de fato criadores e adaptadores das tecnologias de auto estudo, mas o resultado depende exclusivamente da nossa preparação para realmente tirara proveito destas tecnologias.

  A COVID-19, obrigou que nossas escolas percebessem que não estavam preparadas para ensino à distância, assim como nossos professores. Tornou-se comum a cena de professores em uma sala escrevendo em um quadro e os alunos em casa assistindo pelo computador, na realidade só mudava a cadeira, a aula era o mesma.

7) O ensino será mais agradável e interessante, o que favorecerá o engajamento dos estudantes. Dispositivos eletrônicos, diversidade de aplicativos, games, aprendizagem ativa em ambientes virtuais, entre outros processos facilitados pela tecnologia tornarão a educação menos burocrática, repetitiva e desmotivadora.

  Em contrapartida, se não tivermos programas educacionais adequados, exacerbaremos o aprendizado do Generalismo e do aprendizado empírico que tem como fator o superficialismo e a perda das habilidades da pesquisa científica afetando a compreensão e o solução de problemas.

  Entretanto, programas adequados e tecnologias que coloquem o estudante em situações de realidades virtuais que seriam impossíveis de presenciar pessoalmente prometem ser eficientes.

  Cerca de 12% dos jovens brasileiros de 15 a 17 anos não estão na escola e um levantamento feito pela consultoria IDados mostra que a falta de interesse nos estudos é o principal motivo apontado por esses adolescentes, superando até mesmo dificuldades como a falta de dinheiro para as despesas escolares, gravidez precoce, problemas de saúde e ausência de vagas na região onde moram.

  No levantamento, destacamos que a gravidez, não está inserida na falta de interesse o que elevaria para 50,25% as meninas fora da escola por estas dificuldades.

  O que esperar de jovens que não veem expectativas de garantia de emprego e uso de suas habilidades pela falta de oportunidades? O que esperar de adolescentes que não tiveram acesso à educação de qualidade nem foram ensinados a aprender?

  Para superar esta defasagem de décadas de atraso na educação, precisamos decidir o que queremos como nação e como vamos retirar todas as influências ideológicas e entender que educação não tem viés político. Precisamos entender que a educação de um povo é sua salvaguarda para sobreviver como nação.

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